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domingo, 14 de julho de 2019

TRECHOS DA OBRA: SER OU NÃO SER SANTO... EIS A QUESTÃO: A ORAÇÃO EM SI MESMA (ÚLTIMA PARTE)

5. EFICÁCIA INFALÍVEL DA ORAÇÃO 

Antes, vamos estabelecer com todo rigor uma tese teológica, a qual demonstraremos plenamente, como se faz nas escolas de teologia: 
TESE: “A oração, revestida das devidas condições, obtém infalivelmente o que pede, em virtude das promessas de Deus”.
Muitos teólogos consideraram essa tese como de fé, pela claridade com que se nos manifesta na Sagrada Escritura a promessa divina. Eis aqui alguns dos textos mais significativos: 


“Pedi e vos será dado! Procurai e encontrarei! Batei e a porta vos será aberta! Pois todo aquele que pede recebe, quem procura encontra, e a quem bate, a porta será aberta” (Mt 7,7-8).
“Tudo o que, na oração, pedirdes com fé, vós o recebereis” (Mt 21,22).
“E o que pedirdes em meu nome, eu o farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho. Se pedirdes algo em meu nome, eu o farei” (Jo 14,13-12).
“Se permanecerdes em mim, e minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes, e vos será dado” (Jo 15,7).
“Em verdade, em verdade, vos digo: se pedirdes ao Pai alguma coisa em meu nome, ele vos dará. Até agora, não pedistes nada em meu nome. Pedi e recebereis, para que vossa alegria seja completa. Jesus venceu o mundo” (Jo 16,23-24).
“E esta é a confiança que temos em Deus: se lhe pedimos alguma coisa de acordo com a sua vontade, ele nos ouve. E se sabemos que ele nos ouve em tudo o que lhe pedimos, sabemos que possuímos o que havíamos pedido” (1Jo 5, 14-15).


É impossível falar com maior clareza e insistência mais premente. A promessa divina consta com toda certeza na divina revelação.
Ora, quais são as condições requeridas para que a oração alcance infalivelmente seu objeto, cumprindo-se de fato as divinas promessas?
Santo Tomás assinala quatro, e a elas podem se reduzir todas as demais assinaladas por outros autores. Aqui estão suas palavras:
“Logo, sempre obteremos o que pedimos, contanto que se estabeleçam estas quatro condições: pedir para si mesmo coisas necessárias à salvação, piedosamente e com perseverança”.
4 

[...].

6. A ORAÇÃO DOMINICAL: O PAI NOSSO 

Santo Tomás pergunta em um artigo da Suma Teológica “se são convenientes assinaladas as sete petições da oração dominical, o Pai-nosso” (83,9). Cremos que a maravilhosa doutrina exposta por Santo Tomás ao responder afirmativamente, faz desse artigo um dos mais sublimes e profundos de sua obra imortal, verdadeira fortaleza da Teologia Católica. 
Começa Santo Tomás dizendo que a oração dominical é perfeita, pois contém tudo o que devemos pedir e na ordem que se deve pedir. Aqui estão suas palavras:

A oração Dominical é perfeitíssima, porque como diz Agostinho, se oramos reta e convenientemente, não podemos pedir senão o que está formulado na Oração Dominical. Pois, sendo a oração, de certo modo, o intérprete do nosso desejo junto a Deus quando oramos, só podemos pedir com retidão o que com retidão podemos desejar. Ora, na Oração Dominical, não só pedimos todas as coisas que podemos retamente desejar, mas, ainda, na ordem em que são desejáveis. De modo que essa Oração não só nos ensina a pedir, mas também manifesta todo o nosso afeto.
Ora, é claro que o objeto primário do nosso desejo é o fim e o secundário os meios. Mas o nosso fim é Deus, para o qual o nosso afeto tende duplamente: por lhe querermos a glória, e por querermos gozá-la. E desses dois modos, o primeiro pertence ao amor com que amamos a Deus em si mesmo; o segundo, ao com que nos amamos, em Deus. Por isso, a primeira petição é assim formulada: Seja santificado o teu nome, pela qual pedimos a glória de Deus. A segunda assim: Venha a nós o teu reino, pela qual pedimos que alcancemos a glória do seu reino, isto é, alcançar a vida eterna.

Como se vê, as duas primeiras petições do Pai-nosso não podem ser mais sublimes. Na primeira pedimos a glória de Deus, ou seja, que todas as criaturas reconheçam e glorifiquem (isso significa aqui santificar) o nome de Deus. Tal é, precisamente, o fim último da criação; a glória de Deus, ou mais exatamente e teologicamente, Deus mesmo glorificado pelas criaturas. Essa glória de Deus constituía a obsessão de todos os santos. No topo da montanha da santidade se lê sempre indefectivelmente o rótulo colocado por São João da Cruz no alto de seu Monte Carmelo: “Só mora neste monte a honra e a glória de Deus”. O eu humano, terreno e egoísta morreu definitivamente.
Porém, Deus quis encontrar sua própria glória em nossa própria felicidade. Não nos proíbe, mas nos manda desejar nossa própria felicidade em Deus. Mas essa felicidade deve estar unicamente em segundo lugar, em perfeita subordinação à glória de Deus, na medida e grau de seu beneplácito divino: Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo” (Mt 6,33). Ao pedir a Deus o advento de seu reino sobre nós, lhe pedimos na realidade a graça e a glória para nós, ou seja, a maior e mais sublime que podemos pedir depois da glória de Deus.

Depois do fim principal e secundário, deve-se desejar, logicamente, os meios para alcançá-lo. Escutemos a Santo Tomás:

Ora, ao fim supra referido um meio pode nos conduzir duplamente: por si mesmo e por acidente.
5 Por si, quando é um bem útil para o fim. Mas, um meio pode ser útil para o fim de dois modos. – De um modo, direta e principalmente, conforme o mérito com que merecemos a felicidade, obedecendo a Deus. E por isso é que a Oração diz: Faça-se a tua vontade assim na terra como no céu. – De outro modo, instrumentalmente e como nos ajudando a merecer. E é isto o que visa a petição. O pão nosso de cada dia dá-nos hoje. Quer o entendamos do pão sacramental, cujo uso quotidiano nos alimenta, e no qual se compreendem os outros sacramentos; quer do pão corporal, entendendo-se por pão todo o necessário à nossa subsistência, como diz Agostinho. Pois a Eucaristia é o sacramento principal como o pão é o alimento principal.

Como se vê, depois de ter pedido nas duas primeiras petições o relativo ao fim principal e ao secundário, se começa imediatamente a pedir o relativo aos meios. Também aqui se procede ordenadamente pedindo em primeiro lugar que cumpramos a vontade de Deus de maneira tão perfeita, se possível, como se cumpre no Céu. É porque o cumprimento da vontade de Deus é o único meio direto e imediato de glorificar a Deus e de santificar nossa alma. Ninguém se santificará nem poderá glorificar a Deus, a não ser cumprindo exata e rigorosamente sua divina e adorável vontade. Se Deus nos pede obscuridade e silêncio, enfermidade e impotência, vida escondida e desconhecida, é inútil que tratemos de lhe glorificar ou de nos santificar sonhando com grandes empresas apostólicas ou obras brilhantes à serviço de Deus; andaremos completamente fora do caminho. Nada glorifica a Deus nem santifica a alma senão o perfeito cumprimento de sua divina vontade.
Porém, ao lado desse meio fundamental e imediato, necessitamos também da ajuda dos meios secundários, simbolizados na palavra pão, que é alimento por excelência. Pedimos o pão, ou seja, o indispensável para a vida (nada de riquezas e honras, que são bem fugazes e aparentes, que tanto se prestam a nos desviar dos caminhos de Deus); e unicamente para hoje, “com o fim de ficar obrigados a pedi-lo amanhã e corrigir nossa cobiça” – como disse admiravelmente o catecismo – e para que descansemos confiantes e tranquilos nos braços da providência amorosa de Deus, que alimenta aos pássaros do céu e veste as flores do campo com soberana beleza (Mt 6,25-34).

Sigamos com a exposição de Santo Tomás:

Acidentalmente nós nos ordenamos à felicidade, pela remoção dos obstáculos. Ora, há três obstáculos que nô-la impedem. – O primeiro é o pecado, que diretamente nos exclui do reino, conforme o Apóstolo: Nem os fornicários, nem os idólatras., hão de possuir o reino de Deus. E a isto se referem as expressões: Perdoai-nos as nossas ofensas.
O segundo é a tentação, que nos impede obedecer a vontade divina. E a isto se referem se referem as expressões: E não nos Deixeis cair em tentação, com que não pedimos para não sermos tentados, mas para não sermos vencidos pelas tentações, que é o sentido da expressão referida. O terceiro são as penas desta vida, que lhe tiram a plenitude. E a isso se referem as expressões; Livrai-nos do mal.

Através dessa magnífica exposição de Santo Tomás – que ainda completa com as soluções às objeções –, se adverte claramente que é impossível pedir a Deus mais coisas, nem melhores, nem mais ordenadamente, nem com menos palavras, nem com maior simplicidade e confiança do que na sublime oração do Pai-nosso. Por isso os santos, iluminados por Deus mediante os dons do Espírito Santo, encontram um verdadeiro “maná escondido” na oração dominical. Vivem dela anos inteiros, e ainda toda a vida, alimentando sua oração com suas divinas petições. Santa Teresinha do Menino Jesus chegou a não encontrar gosto senão no Pai-nosso e na Ave-Maria.
6 Santa Teresa o comenta magistralmente em seu Camino de Perfección.7 E muitas almas simples e humildes encontram nele pasto abundante para sua oração,8 e até para remontar aos mais altos cumes da contemplação e da união mística com Deus. Escreve Santa Teresa (Camino 37,1): “Espanta-me ver que em tão poucas palavras está toda a contemplação e perfeição encerrada. Parece não ser mister outro livro: basta estudar o Pai-nosso”. Págs. 291-294; 296-302; 306-312.

[...].

___________
4 II-II, 83,15 ad 2.
5 Santo Tomás emprega a formula escolástica per se y per accidens, que pode ser traduzida em nosso caso por direta ou diretamente.
6 Em suas próprias palavras: “Algumas vezes, quando meu espírito se encontra em grande aridez, de modo que não me ocorre nem um pensamento bom, rezo muito devagar um Pai-nosso e uma Ave-Maria. Estas orações são as únicas que me elevam, as que nutrem minha alma ao divino, elas me bastam”. (História de uma alma c.10, n.19).
7 SANTA TERESA, CAMINO DE PERFECCIÓN, CAPÍTULOS 27 ATÉ 47 (FINAL DO LIVRO).
8 Recordem o caso daquela vaqueira que, guardando suas vacas, passava longas horas de oração “pensando que Aquele que está no alto do Céu é meu Pai”. E chorava de emoção ao pensa-lo.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

TRECHOS DA OBRA: SER OU NÃO SER SANTO... EIS A QUESTÃO: A ORAÇÃO EM SI MESMA

 A ORAÇÃO EM SI MESMA; TEOLOGIA
1. NATUREZA
A palavra oração pode ser empregada em diversos sentidos. Seu significado varia totalmente de acordo com sua acepção gramatical, lógica, retórica, jurídica ou teológica. Mesmo em sua acepção teológica, única que nos interessa aqui, foi definida de diversos modos, embora todos coincidam fundamentalmente. Eis algumas definições:

São Gregório de Nazianzo: “A oração é uma conversação ou colóquio com Deus”.

São João Crisóstomo: “A oração é falar com Deus”.

Santo Agostinho: “A oração é a conversão da mente a Deus. Com piedoso e humilde afeto”.

São João Damasceno: “A oração é a elevação da mente a Deus”. Ou também: “a petição da Deus de coisas convenientes”.

São Boaventura: “Oração é o piedoso afeto da mente dirigida a Deus”.

Santa Teresa: “É conviver em amizade, estando muitas vezes a sós com quem sabemos que nos ama”.


Como se vê, todas essas fórmulas – e outras muitas que não foram citadas – coincidem em seus fundamentos. Santo Tomás compilou as duas definições de São João Damasceno, e com elas propôs uma fórmula excelente, que recorre aos principais aspectos da oração. Soa assim: “A oração é a elevação da mente a Deus para louvar e pedir-lhe coisas convenientes à eterna salvação”. Vamos expô-la com mais detalhes, seguindo o Doutor Angélico.
1 É a elevação da mente a Deus: A oração é em si um ato da razão prática (83,1), não da vontade, como creram alguns escotistas. Toda a oração supõe uma elevação da mente a Deus, o que nos adverte que quem ora estando completamente distraído, em realidade não faz oração “mesmo que meneie muito os lábios” (Santa Teresa).

E dizemos “A Deus” porque a oração, como um ato de religião (83,3) se dirige propriamente a Deus, já que só dele podemos receber a graça e a glória, para as quais devem se ordenar todas as nossas orações (83,4); mas não há inconveniente em fazer intervir os anjos, santos e justos da Terra para que, com seus méritos e interseção, sejam mais eficazes nossas orações (ibid.).

a) Para louvar... é uma das finalidades mais nobres e mais próprias da oração.
Seria um erro pensar que a oração serve apenas como um puro meio para pedir coisas a Deus. A adoração, o louvor, a reparação dos pecados e a ação de graças pelos benefícios recebidos encaixam admiravelmente na oração (83,17).
b) Pedir-lhe... É a nota mais típica da oração estritamente dita. O próprio de quem ora é pedir. Quem ora se sente débil e indigente, e por isso recorre a Deus para que se apiede dele. É a oração de súplica ou de petição.
c) Coisas convenientes à salvação eterna. Não nos é proibido pedir coisas temporais (83,6); mas não principalmente, nem as colocando como fim último da oração, senão unicamente como instrumentos para melhor servir a Deus e tender para a nossa felicidade eterna. Em si, as petições próprias da oração são as que se referem à vida sobrenatural, as únicas que terão uma repercussão eterna. O temporal vale pouco, passa rápido e é fugaz como um relâmpago. Se pode pedir unicamente como acréscimo, com inteira subordinação aos interesses da glória de Deus e salvação das almas: “Buscai primeiro o reino de Deus e sua justiça, e tudo mais vos será dado por acréscimo” (Mt 6,33). 

[...]. 

3. O QUE SE PODE OBTER POR VIA DE ORAÇÃO 


Segundo estas noções, podemos obter por via da oração o acréscimo das virtudes infusas e dos dons do Espírito Santo que as acompanham, o que se traduzirá em um aumento ou desenvolvimento de nossa vida cristã; e também as graças atuais eficazes; sobretudo, a graça soberana da perseverança final, que ninguém absolutamente pode merecer – nem sequer os maiores santos –, por ser total e absolutamente gratuita. Só a oração pode alcançar essas graças que escapam em absoluto ao mérito propriamente dito.
A igreja nos dá o exemplo desta classe de petições quando em sua liturgia pede continuamente a graça da perseverança final ou o aumento das virtudes infusas: “Deus todo poderoso e eterno, aumenta nossa fé, esperança e caridade...”.
2  Escutemos a Santo Tomás expondo esta doutrina com sua clareza habitual:3 

Mesmo o que não merecemos, impetramos nas nossas orações; pois Deus ouve os pecadores que pedem dos pecados o perdão que não merecem, como claramente o diz Agostinho, comentando aquilo da Escritura: - Sabemos que Deus não ouve a pecadores (Jo 9,31). Pois, do contrário, o publicano teria dito em vão: Meu Deus, sê propício a mim pecador (Lc 18,13). E semelhantemente, pedindo, obteremos de Deus o dom da perseverança final, para nós mesmos ou para outrem, embora não o possam merecer. 

[...]. 

4. EFICÁCIA SANTIFICADORA DA ORAÇÃO 

Os santos padres e os grandes mestres da vida espiritual estão unânimes em ponderar a eficácia santificadora verdadeiramente extraordinária da oração bem feita. Sem oração – sem muita oração – é impossível chegar à santidade. 
São inumeráveis os testemunhos que se poderiam alegar sobre esta questão. Só por via de exemplo vamos citar o conhecido e bel texto de São Boaventura: 

Se queres sofrer com paciência as adversidades e misérias desta vida, sê homem de oração. Se queres alcançar virtude e fortaleza para vencer as tentações do inimigo, sê homem de oração. Se queres conhecer as astúcias de Satanás e defender-te de enganos, sê homem de oração. Se queres viver alegremente e caminhar com suavidade pelo caminho da penitência e do trabalho, sê homem de oração. Se queres afastar tua alma dos vãos pensamentos e cuidados, sê homem de oração. Se queres sustentar com a grandeza da devoção e trazê-la sempre cheia de bons pensamentos e desejos, sê homem de oração. Se queres fortalecer teu coração no caminho de Deus, sê homem de oração. Finalmente, se queres desarraigar de tua alma todos os vícios e plantar em seu todas as virtudes, sê homem de oração: porque nela se recebe a unção e graça do Espírito Santo, a qual mostra todas as coisas. E, ademais, se queres subir à altura da contemplação e gozar dos doces abraços do esposo, exercita-te na oração, porque este é o caminho por onde sobe a alma à contemplação e gosto pelas coisas celestiais.

[...].


Link para a continuação do post: TRECHOS DA OBRA: SER OU NÃO SER SANTO... EIS A QUESTÃO: A ORAÇÃO EM SI MESMA (ÚLTIMA PARTE)

___________
1 Suma Teológica, II-II, 83, 1a et ad 2.
2 Missal Romano, Oração coleta do 300 domingo do Tempo Comum.
3 I-II, 114,9 ad 1.





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