quinta-feira, 11 de julho de 2019

TRECHOS DA OBRA: SER OU NÃO SER SANTO... EIS A QUESTÃO: A ORAÇÃO EM SI MESMA

 A ORAÇÃO EM SI MESMA; TEOLOGIA
1. NATUREZA
A palavra oração pode ser empregada em diversos sentidos. Seu significado varia totalmente de acordo com sua acepção gramatical, lógica, retórica, jurídica ou teológica. Mesmo em sua acepção teológica, única que nos interessa aqui, foi definida de diversos modos, embora todos coincidam fundamentalmente. Eis algumas definições:

São Gregório de Nazianzo: “A oração é uma conversação ou colóquio com Deus”.

São João Crisóstomo: “A oração é falar com Deus”.

Santo Agostinho: “A oração é a conversão da mente a Deus. Com piedoso e humilde afeto”.

São João Damasceno: “A oração é a elevação da mente a Deus”. Ou também: “a petição da Deus de coisas convenientes”.

São Boaventura: “Oração é o piedoso afeto da mente dirigida a Deus”.

Santa Teresa: “É conviver em amizade, estando muitas vezes a sós com quem sabemos que nos ama”.


Como se vê, todas essas fórmulas – e outras muitas que não foram citadas – coincidem em seus fundamentos. Santo Tomás compilou as duas definições de São João Damasceno, e com elas propôs uma fórmula excelente, que recorre aos principais aspectos da oração. Soa assim: “A oração é a elevação da mente a Deus para louvar e pedir-lhe coisas convenientes à eterna salvação”. Vamos expô-la com mais detalhes, seguindo o Doutor Angélico.
1 É a elevação da mente a Deus: A oração é em si um ato da razão prática (83,1), não da vontade, como creram alguns escotistas. Toda a oração supõe uma elevação da mente a Deus, o que nos adverte que quem ora estando completamente distraído, em realidade não faz oração “mesmo que meneie muito os lábios” (Santa Teresa).

E dizemos “A Deus” porque a oração, como um ato de religião (83,3) se dirige propriamente a Deus, já que só dele podemos receber a graça e a glória, para as quais devem se ordenar todas as nossas orações (83,4); mas não há inconveniente em fazer intervir os anjos, santos e justos da Terra para que, com seus méritos e interseção, sejam mais eficazes nossas orações (ibid.).

a) Para louvar... é uma das finalidades mais nobres e mais próprias da oração.
Seria um erro pensar que a oração serve apenas como um puro meio para pedir coisas a Deus. A adoração, o louvor, a reparação dos pecados e a ação de graças pelos benefícios recebidos encaixam admiravelmente na oração (83,17).
b) Pedir-lhe... É a nota mais típica da oração estritamente dita. O próprio de quem ora é pedir. Quem ora se sente débil e indigente, e por isso recorre a Deus para que se apiede dele. É a oração de súplica ou de petição.
c) Coisas convenientes à salvação eterna. Não nos é proibido pedir coisas temporais (83,6); mas não principalmente, nem as colocando como fim último da oração, senão unicamente como instrumentos para melhor servir a Deus e tender para a nossa felicidade eterna. Em si, as petições próprias da oração são as que se referem à vida sobrenatural, as únicas que terão uma repercussão eterna. O temporal vale pouco, passa rápido e é fugaz como um relâmpago. Se pode pedir unicamente como acréscimo, com inteira subordinação aos interesses da glória de Deus e salvação das almas: “Buscai primeiro o reino de Deus e sua justiça, e tudo mais vos será dado por acréscimo” (Mt 6,33). 

[...]. 

3. O QUE SE PODE OBTER POR VIA DE ORAÇÃO 


Segundo estas noções, podemos obter por via da oração o acréscimo das virtudes infusas e dos dons do Espírito Santo que as acompanham, o que se traduzirá em um aumento ou desenvolvimento de nossa vida cristã; e também as graças atuais eficazes; sobretudo, a graça soberana da perseverança final, que ninguém absolutamente pode merecer – nem sequer os maiores santos –, por ser total e absolutamente gratuita. Só a oração pode alcançar essas graças que escapam em absoluto ao mérito propriamente dito.
A igreja nos dá o exemplo desta classe de petições quando em sua liturgia pede continuamente a graça da perseverança final ou o aumento das virtudes infusas: “Deus todo poderoso e eterno, aumenta nossa fé, esperança e caridade...”.
2  Escutemos a Santo Tomás expondo esta doutrina com sua clareza habitual:3 

Mesmo o que não merecemos, impetramos nas nossas orações; pois Deus ouve os pecadores que pedem dos pecados o perdão que não merecem, como claramente o diz Agostinho, comentando aquilo da Escritura: - Sabemos que Deus não ouve a pecadores (Jo 9,31). Pois, do contrário, o publicano teria dito em vão: Meu Deus, sê propício a mim pecador (Lc 18,13). E semelhantemente, pedindo, obteremos de Deus o dom da perseverança final, para nós mesmos ou para outrem, embora não o possam merecer. 

[...]. 

4. EFICÁCIA SANTIFICADORA DA ORAÇÃO 

Os santos padres e os grandes mestres da vida espiritual estão unânimes em ponderar a eficácia santificadora verdadeiramente extraordinária da oração bem feita. Sem oração – sem muita oração – é impossível chegar à santidade. 
São inumeráveis os testemunhos que se poderiam alegar sobre esta questão. Só por via de exemplo vamos citar o conhecido e bel texto de São Boaventura: 

Se queres sofrer com paciência as adversidades e misérias desta vida, sê homem de oração. Se queres alcançar virtude e fortaleza para vencer as tentações do inimigo, sê homem de oração. Se queres conhecer as astúcias de Satanás e defender-te de enganos, sê homem de oração. Se queres viver alegremente e caminhar com suavidade pelo caminho da penitência e do trabalho, sê homem de oração. Se queres afastar tua alma dos vãos pensamentos e cuidados, sê homem de oração. Se queres sustentar com a grandeza da devoção e trazê-la sempre cheia de bons pensamentos e desejos, sê homem de oração. Se queres fortalecer teu coração no caminho de Deus, sê homem de oração. Finalmente, se queres desarraigar de tua alma todos os vícios e plantar em seu todas as virtudes, sê homem de oração: porque nela se recebe a unção e graça do Espírito Santo, a qual mostra todas as coisas. E, ademais, se queres subir à altura da contemplação e gozar dos doces abraços do esposo, exercita-te na oração, porque este é o caminho por onde sobe a alma à contemplação e gosto pelas coisas celestiais.

[...].


Link para a continuação do post: TRECHOS DA OBRA: SER OU NÃO SER SANTO... EIS A QUESTÃO: A ORAÇÃO EM SI MESMA (ÚLTIMA PARTE)

___________
1 Suma Teológica, II-II, 83, 1a et ad 2.
2 Missal Romano, Oração coleta do 300 domingo do Tempo Comum.
3 I-II, 114,9 ad 1.





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